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O que são FADs e quais os impactos na construção civil?

Fabiana da Rocha Cleto, Luciana Alves de Oliveira e Cláudio V. Mitidieri Filho

Publicado em: 26/02/2021

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

Coordenação técnica: Adriana Camargo de Brito
Comitê de revisão técnica: Adriana Camargo de Brito, Cláudio Vicente Mitidieri Filho, José Maria de Camargo Barros, Luciana Oliveira e Maria Akutsu
Apoio editorial: Cozza Comunicação

26/02/2021 | 15:30 - Para discutir os impactos e os benefícios das Fichas de Avaliação de Desempenho (FADs) no setor da construção civil, é preciso saber o que são, para que servem e qual é o processo de elaboração.

As FADs são documentos técnicos que contém parâmetros de desempenho de um determinado elemento ou sistema construtivo convencional, considerando as características técnicas de seus materiais e componentes constituintes e as condições de execução ou instalação. Esses documentos são desenvolvidos por empresas ou associações de empresas, juntamente com Instituições Técnicas Avaliadoras no âmbito do Sistema Nacional de Avaliações Técnicas de produtos inovadores e sistemas convencionais (SiNAT), do Programa Brasileiro da Qualidade e Produtividade do Habitat (PBQP-H), atualmente vinculado à Secretaria Nacional da Habitação do Ministério do Desenvolvimento Regional (SNH/MDR).

Para visualizar a relevância desses documentos, é feita uma breve retrospectiva de como surgiram. Em 2007, o SINAT foi implantado no Brasil com o objetivo de unificar as diretrizes de avaliação técnica e a sistemática de concessão de documentos de avaliação técnica de produtos inovadores da construção civil, à luz do conceito de desempenho. A princípio, o SINAT contemplava somente as inovações tecnológicas que não eram normalizadas nem consagradas no país. A partir de 2013, principalmente em razão da publicação da norma de desempenho, ABNT NBR 15575, o setor da construção percebeu a necessidade de se conhecer também o desempenho dos sistemas convencionais, ou seja, daqueles executados por processos tradicionais no país, cujos materiais, componentes e o próprio elemento ou sistema construtivo sejam contemplados por normas prescritivas nacionais, que possam orientar inclusive a elaboração de projetos e sua execução em obra.

Em 2015, um grupo de especialistas, sob a coordenação do PBQP-H, desenvolveu o documento denominado “Catálogo de Desempenho de Sistemas Convencionais”, o qual foi o embrião da criação das FADs e, no ano seguinte, foi oficialmente ampliado o escopo do SiNAT incluindo os produtos convencionais. Desde então, o SiNAT tem passado por algumas mudanças na sua estrutura organizacional e em seu funcionamento, visando seu aprimoramento, com incorporação dos sistemas convencionais, além dos inovadores, e consequentemente das FADs.

Atualmente, o processo de desenvolvimento de uma FAD inicia-se com a solicitação de um proponente, como um fabricante, uma associação que representa o setor produtivo do objeto da FAD, ou mesmo uma empresa construtora. O proponente entra em contato com uma Instituição Técnica Avaliadora (ITA) credenciada no SiNAT, a qual é responsável pela análise da documentação técnica disponível, realização de análises e ensaios de desempenho necessários, análise de eventuais parâmetros de desempenho já disponíveis, realização de ensaios de caracterização de materiais e componentes e encaminhamentos junto ao SiNAT, por meio de sua Secretaria Geral.

Os relatórios de avaliação de desempenho devem ser acompanhados das características do elemento ou do sistema convencional, incluindo seus materiais e componentes; os métodos de ensaio devem estar em conformidade com as normas técnicas e os resultados da avaliação de desempenho, ou seja, os parâmetros de desempenho devem atender requisitos e critérios estabelecidos na ABNT NBR 15575. Se houver resultados de ensaios realizados em laboratórios distintos, cabe à ITA avaliar a consistência e a rastreabilidade dos dados apresentados nos relatórios.

Após tais análises e definição dos parâmetros de desempenho para o elemento ou sistema construtivo, a ITA encaminha uma Minuta de FAD para a Secretaria Geral do SiNAT, que se encarrega do processo de tramitação nas instâncias do SiNAT, conforme consta do seu Regimento Geral.

Quanto ao documento propriamente dito, foi idealizado um modelo de FAD com um conteúdo mínimo e uma estrutura padrão, visando uniformizar e balizar sua elaboração pelas diferentes ITAs. Inicialmente, deve constar a identificação do elemento ou sistema construtivo (incluindo desenho esquemático), as premissas da avaliação de desempenho e as condições de uso da FAD, contendo informações como:

• Função, aplicações e restrições de uso do sistema;
• Requisitos de desempenho considerados, de acordo com a ABNT NBR 15575; e
• Relação das normas prescritivas consideradas para caracterizar o elemento/sistema construtivo e seus componentes.

Na sequência, devem ser apresentados os itens relativos à avaliação técnica do produto e de suas partes, cujos conteúdos são resumidos a seguir.

• Caracterização: identifica as características técnicas de cada material ou componente constituinte do elemento ou sistema construtivo, determinadas por meio de ensaios específicos, conforme as normas técnicas prescritivas. Descreve, também, as características gerais do sistema, podendo incluir recursos como tabelas, desenhos esquemáticos e fotos para facilitar o entendimento das descrições.
• Considerações de projeto e execução: define detalhes específicos de projeto e práticas de instalação ou execução, conforme considerado nas avaliações técnicas realizadas.
• Resultados de Desempenho: apresenta os resultados obtidos na avaliação de desempenho, ou seja, os parâmetros de desempenho do elemento ou sistema construtivo objeto da FAD. São compilados, de forma consistente, os valores obtidos nos ensaios laboratoriais e/ou de campo, com resumo das principais características técnicas relacionadas ao desempenho.
• Fontes de informação: são listados os relatórios técnicos, relatórios de ensaios e outros documentos técnicos, considerados pela ITA, com as respectivas datas de emissão e instituição emissora. São citadas, também, as principais normas e publicações técnicas utilizadas na avaliação.
Um exemplo da estrutura geral do documento pode ser visto na Figura 1.

Figura 1 – Exemplo de uma FAD

ficha de avaliação

Considerando, então, a implementação dessas FADs, conforme explanado, quais seriam os principais impactos no setor da construção civil? Por exemplo, para as empresas fabricantes de componentes, tornou-se possível, com as FADs, apresentar ao mercado resultados do desempenho de diversas configurações de elementos ou sistemas construtivos que podem ser construídos com os seus componentes. Além disso, o processo de elaboração de uma FAD permite e incentiva uma maior organização setorial desses fabricantes, propiciando a colaboração entre empresas que atuam no mesmo segmento de mercado e que estão interessadas na obtenção de um documento técnico de referência. Isso porque os fabricantes, cujos produtos estejam contemplados por uma FAD, conseguem criar um diferencial mercadológico, aumentando a sua competitividade.

As empresas projetistas também podem se beneficiar com as FADs, uma vez que esses documentos explicitam considerações técnicas de projeto e especificações de produtos que podem balizar tais profissionais nas tomadas de decisão dos seus diversos projetos. Dessa forma, as FADs podem ser utilizadas pelos projetistas como referencial técnico para selecionar soluções de elementos ou sistemas construtivos com as mesmas características das amostras ensaiadas, cujo potencial desempenho já é conhecido e pode ser considerado na análise da ABNT NBR 15575.

As empresas construtoras, por sua vez, também se beneficiam ao adotarem as FADs e incorporá-las ao seu processo de seleção de produtos e de qualificação de fornecedores, tendo segurança acerca do desempenho potencial das soluções tecnológicas utilizadas. Saber de antemão alguns resultados faz com que a construtora reduza seus investimentos em avaliações técnicas, visando a comprovação de desempenho. O uso de uma FAD pela empresa construtora gera, ainda, maior segurança em relação ao elemento ou sistema construtivo selecionado, pois a FAD traz confiabilidade das informações declaradas. A construtora pode, também, incorporar as informações constantes da FAD no seu Plano de Qualidade de Obras, estabelecendo procedimentos de execução e de inspeção que controlem as principais variáveis que influenciam o desempenho do produto empregado na sua obra. Além disso, a FAD pode auxiliar nas evidências do atendimento à ABNT NBR 15575, exigida em alguns processos de certificação de Sistemas de Gestão da Qualidade, como é o caso do Sistema de Avaliação da Conformidade de Empresas de Serviços e Obras da Construção Civil (SiAC), no PBQP-H.

Para os agentes financeiros, as FADs são um importante instrumento para balizar as iniciativas de financiamento da construção de habitações no Brasil. Esses documentos servem como um guia técnico que deve ser adotado pela construtora e controlado pelo agente financeiro nas etapas de especificação de um componente, elemento ou sistema convencional, no projeto, na execução e no acompanhamento da obra que emprega tais produtos, inclusive na etapa de controle da qualidade e do recebimento dos produtos que são objetos das FADs. Inclusive, em novembro de 2018, foi publicada a Portaria nº 660, a qual dispõe sobre as diretrizes para elaboração de projetos no âmbito do “Programa Minha Casa, Minha Vida”, estabelecendo, dentre outros aspectos, que o projeto da habitação deve atender às diretrizes do PBQP-H, incluindo a adoção das FADs para os sistemas convencionais.

Dessa forma, as FADs, ao serem utilizadas por todos os agentes que fazem parte do processo de produção das edificações, contribuem para que a qualidade e o desempenho sejam benefícios também notados pelos futuros moradores dessas habitações e por toda a sociedade.

Referências

ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE NORMAS TÉCNICAS (ABNT). NBR 15575 - Edificações habitacionais - Desempenho. Partes 1 a 6. Rio de Janeiro, 2013.

BRASIL. Ministério das Cidades. Especificações de desempenho nos empreendimentos de HIS baseadas na ABNT NBR 15575. Catálogo de Desempenho de Sistemas Convencionais e Fichas de Avaliação de Desempenho - FADs. 21 de outubro de 2015. Disponível em: http://app.mdr.gov.br/catalogo/src/paginas/ catalogoConvencional.php.

BRASIL. Ministério das Cidades. Portaria nº 550, de novembro de 2016. Regimento geral do Sistema Nacional de Avaliações Técnicas de produtos inovadores e sistemas convencionais - SiNAT. Diário Oficial da União, Brasília, DF, Seção 1, nº 218, 14 de novembro de 2016. Disponível em: http://pbqp-h.mdr.gov.br/ projetos_sinat.php.

Colaboração técnica

Fabiana da Rocha Cleto – engenheira civil e mestre em Engenharia de Construção Civil pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Pesquisadora do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo desde 2003. Atua principalmente nas áreas de tecnologias inovadoras empregadas na construção, avaliação de desempenho de componentes e sistemas construtivos, diagnóstico de patologias de edificações, gestão de programas setoriais da qualidade, participação em projetos de desenvolvimento como o SINAT – Sistema Nacional de Avaliações Técnicas de produtos inovadores e em projetos de pesquisa como o Programa HABITARE, financiado pela FINEP, sobre Códigos de Práticas Construtivas recomendadas para a construção civil.
Luciana Alves de Oliveira – pesquisadora do Laboratório de Componentes e Sistemas Construtivos-LCSC e docente do Programa de Mestrado Profissional em Habitação, do Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo, IPT.
Cláudio Vicente Mitidieri Filho – engenheiro civil, doutor em Engenharia de Construção Civil e Urbana pela Escola Politécnica da USP, pesquisador do Laboratório de Componentes e Sistemas Construtivos do IPT e professor do Programa de Mestrado Profissional em Habitação do IPT.