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Como criar composições de custos para orçamentos de obras?

Bases de dados de mercado podem ser utilizadas como referência, mas é importante que as construtoras conheçam seus índices de produtividade, consumo de materiais e preços praticados

Publicado em: 29/04/2024

Texto: Eric Cozza

Uma imagem dividida mostrando uma construção detalhada do edifício com andaimes à esquerda, e uma visualização aproximada de uma planilha com dados de produtos para orçamento de obras à direitaFerramenta relacionada à engenharia de custos utilizada na elaboração de orçamentos de obras, uma composição de custos apresenta todos os insumos envolvidos na execução de determinado serviço, quantidades, custos unitários e índices de produtividade e consumos de materiais (Imagem: Montagem Cozza Comunicação)


Desenvolver e manter uma base própria de composições de custos para orçamentos de obras é essencial para qualquer construtora. Se você ainda acredita que trabalhar apenas com tabelas de referência de mercado é suficiente para a sua empresa, melhor rever alguns conceitos.

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Bases de dados como o Sinapi (Sistema Nacional de Pesquisa de Custos e Índices da Construção Civil), TCPO (Tabela de Composições e Preços para Orçamentos) ou Sicro (Sistema de Custos Referenciais de Obras) são ferramentas úteis e importantes – em alguns casos, até mandatórias, a depender das exigências do contratante –, mas como referência e não para o uso indiscriminado em qualquer circunstância.

Uma construtora deve conhecer seus próprios índices de produtividade e consumos em diferentes tipos de serviços. Esses dados devem estar refletidos nos orçamentos para aumentar a assertividade dos valores estimados.

Mas como desenvolver sua própria base de dados se você não tem muitas referências próprias anteriores? Para nos falar sobre a relevância desse trabalho em prol da competividade das construtoras, nós convidamos para o Podcast AEC Responde o engenheiro de custos Gustavo Martins, fundador e CEO da eCustos, além de diretor de operações do software Gestor Obras.

Ouça o áudio e/ou leia entrevista, a seguir:

AECweb – O que é uma composição de custo para orçamentos de obras e por que as construtoras devem desenvolver sua base própria?

Gustavo Martins – Eu sempre uso uma analogia da receita do bolo de laranja para explicar o conceito de composição de custos. Para começar a fazê-lo, precisamos de laranja, do fermento e dos demais ingredientes, que chamamos de insumos na construção civil. Nas obras, é a mesma coisa. Para fazer um serviço de alvenaria de bloco cerâmico, também precisamos dos insumos: materiais, mão de obra e equipamentos para a execução. A composição se refere sempre a uma determinada unidade do serviço. No caso do bloco cerâmico, é o metro quadrado. Para uma unidade de metro quadrado, quais insumos e em quais quantidades serão necessárias? No caso do bloco, o pedreiro vai assentar, o servente vai ajudar a fazer o transporte e temos uma determinada quantidade de argamassa. Tudo isso gera um índice de produtividade da composição, contabilizado para uma unidade. Então, quantos blocos cerâmicos, qual quantidade de argamassa e horas de diferentes trabalhadores são necessárias para executar uma unidade de metro quadrado de alvenaria? Isso é uma composição de preços.

AECweb – E por que cada construtora deve desenvolver sua base própria?

Martins – Existem as bases de dados de mercado, mas cada uma tem um perfil voltado para determinado tipo de obra e, em alguns casos, um estado de referência. Se você está construindo, por exemplo, uma residência de alto padrão, você talvez não encontre um piso de porcelanato em alguma dessas bases. Os construtores precisam se atentar, principalmente, aos itens muito específicos, caso de acabamentos e esquadrias, por exemplo. As empresas devem desenvolver suas próprias bases porque, se forem utilizar somente aquelas disponíveis no mercado, os dados serão muito referenciados. Veja, por exemplo a base da FDE (Fundação para o Desenvolvimento da Educação) no estado de São Paulo. É voltada para uma determinada região e com foco na reforma e construção de escolas. Fica difícil empregar para outras tipologias e regiões, sob o risco de acabar com um desvio de preço muito grande.

As empresas devem desenvolver suas próprias bases porque se forem utilizar somente aquelas disponíveis no mercado os dados serão muito referenciados. Veja, por exemplo a base da FDE no estado de São Paulo. É voltada para uma determinada região e com foco na reforma e construção de escolas
Gustavo Martins

AECweb – Medir produtividade nos canteiros, ainda mais em tempos de grande terceirização dos serviços, não é uma tarefa simples. Como as construtoras devem proceder para ter essas informações?

Martins – De fato, é um grande desafio. Temos acompanhado esse assunto da mão de obra e, infelizmente, a produtividade vem caindo a cada ano. Será um desafio daqui para frente. E medir a produtividade não é algo fácil. Existem empresas que fazem essas medições a partir de ferramentas, de sistemas, que acabam associando esse trabalho à parte de qualidade, às fichas de verificação de serviço (FVS), aproveitando alguma coisa nesse sentido. Ou, então, usando um apontador em obra. É claro que isso não é tão simples, porque varia muito da cultura de cada empresa, de a construtora carregar isso no próprio perfil, com seriedade. Não pode ser aquela gestão da qualidade ‘para inglês ver’, algo que, infelizmente, ainda acontece bastante. A minha orientação, para quem vai iniciar esse trabalho, é utilizar aquilo que já se faz e aproveitar os dados. Se você faz apontamentos quinzenais ou mensais, utilize isso. Porque se você colocar uma pessoa lá especificamente para cronometrar a execução, o profissional de campo tende a aumentar o esforço e produzir mais. Outra alternativa é trabalhar com vídeos e filmagens, ou seja, alguma coisa que faça sentido para entender o canteiro, a disposição logística e a execução de cada tipo de serviço.

AECweb – Qual é a sua opinião sobre as bases de dados de referência no mercado, como o Sinapi, Sicro ou TCPO? Como devem ser utilizadas nesse trabalho?

Martins – Se a empresa ou o profissional não tem base nenhuma e quer começar a usar alguma disponível no mercado, deve utilizar os itens do que costumo chamar de ‘obra cinza’, ou seja, aqueles de início do cronograma: alvenaria, fundação, estrutura. O profissional vai conseguir aproveitar bem esses serviços. Agora, ao entrar nos acabamentos, recomendo pegar os itens A e B da Curva ABC e realizar as cotações. Com o restante, é possível usar as bases de mercado, porque qualquer impacto em termos de desvio será bem menor – dependendo do tipo de obra, é claro. Mas não será tão relevante quanto seria errar na curva A ou B. Ou seja, é importante saber usar essas bases de uma maneira estratégica, utilizar o que elas possuem de melhor. O Sinapi, por exemplo, evoluiu bastante. O caderno técnico deles tem muita coisa. O sumário é muito rico, toda a parte de produtividade. Você não precisa começar do zero, pode empregar o que já existe no mercado e aproveitar isso da melhor maneira possível. Claro que não se trata de uma tarefa fácil, mas com conhecimento e ciência dos 10 a 15 itens que vão repetir muito na sua obra – principalmente no caso de construção de residências de médio e alto padrão – você vai perceber que 4 ou 5 etapas vão corresponder de 60% a 70% do valor total da obra. Então, você já consegue ficar mais tranquilo. Por quê? Você já cotou a mão de obra com subempreiteiras – o que vai corresponder de 35% a 40% do valor total da obra.

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O que faz um orçamentista de obras?

AECweb – Algumas bases já trabalham com índices de produtividade variáveis em relação à mão de obra, com base nos conceitos desenvolvidos pelo professor Ubiraci Espinelli Lemes de Souza, da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Os construtores podem olhar para as réguas de produtividade e estimar onde se encaixa a produtividade deles em cada serviço....

Martins – Exato. Esse é um trabalho fantástico do professor Ubiraci, que eu acompanho há um bom tempo. É impressionante a riqueza ali, disponível gratuitamente, via Sinapi. Algo atualizado mensalmente. Você consegue utilizar como referência e aplicar para a sua realidade. Dá para fazer um bom trabalho de uma maneira mais simples.

AECweb – A introdução da metodologia Building Information Modeling e o avanço do BIM 5D alteram de alguma maneira o trabalho dos engenheiros de custos e a forma como desenvolvem a sua base de dados de composições?

Martins – Eu acho que ajuda. Depende sempre da situação, mas sim. Vejo ainda uma certa dificuldade de implementação nas empresas por conta de questões culturais. Há grandes incorporadoras e construtoras que possuem dificuldade de, no início do estudo de viabilidade, saber qual tipo de material será utilizado, se colocam isso no contrato, se poderão alterar algo lá no final. No desenvolvimento no projeto executivo, o arquiteto deve colocar as famílias e indicar o método construtivo. E, no final, o engenheiro de custos vai extrair essas informações, que precisam estar corretas. O trabalho do engenheiro de custos será, praticamente, de validação do que foi feito lá no começo. O BIM facilita o trabalho do engenheiro de custos na questão da extração dos quantitativos, mas desde que o modelo esteja correto, completo e bem definido desde o começo. Na teoria funciona. Na prática, porém, enfrentamos muitos desafios e obstáculos. Mas vejo bons avanços e, com o tempo, vamos conseguir implementar mais o BIM e transformá-lo em um grande aliado para a nossa área.

AECweb – Ou seja, o modelo do BIM tem que conter as informações relacionadas ao orçamento de obras. Caso contrário, não vai adiantar para o engenheiro de custos.

Martins – Exato. Senão, no final do processo, vamos extrair coisas que não batem com a realidade. O projetista acaba tendo essa função de saber exatamente quais são as famílias e os tipos de critérios empregados. Caso contrário, haverá um retrabalho na extração dos quantitativos ou vai nos obrigar a conversar novamente com o projetista, desperdiçando o potencial da metodologia BIM.

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Colaboração técnica

Gustavo Martins – Profissional dedicado à engenharia de custos desde 2003. Em 2014, fundou o primeiro blog de engenharia de custos do Brasil, com mais de 100 mil seguidores no primeiro ano. Co-fundador e CEO do software de orçamento de obras eCustos. Em 2022, torna-se responsável pela atualização de composições (CPU) de um dos maiores bancos do Brasil. Em 2024, assume o cargo de diretor de operações do software Gestor Obras.