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O que faz um profissional de sondagem de solos?

Trabalhar com investigação geotécnica exige afinidade com temas específicos de mecânica de solos, geologia e fundações, além de disposição para atividades de campo. Confira seis competências e habilidades indicadas para a profissão

Publicado em: 01/02/2023

Texto: Eric Cozza

foto de tres trabalhadores em volta de uma máquina em um campo aberto
Grau de complexidade da investigação geotécnica varia muito conforme o tipo e o porte da obra, além do solo encontrado no local. No caso de infraestrutura (túneis, barragens, rodovias, ferrovias etc.), é comum o trabalho multidisciplinar de geólogos, engenheiros civis e até geofísicos (Foto: Shutterstock)

Uma das principais diferenças entre a engenharia de fundações e as demais disciplinas relacionadas à construção civil é o fato de não se trabalhar com materiais de propriedades constantes e delimitadas. É preciso identificar, caso a caso, as características do solo. Para isso, uma boa investigação geotécnica é fundamental.

O profissional responsável por esse trabalho costuma ter formação universitária em engenharia civil, geologia ou geofísica. Seja qual for a graduação, entretanto, será necessário complementar o estudo por meio de estágios supervisionados, iniciação científica ou tecnológica, cursos de especialização ou mestrado.

“Nesse processo, é importante adquirir experiência por meio da interação e transmissão de conhecimentos por profissionais capacitados, com maior grau de senioridade”, recomenda o geólogo e pesquisador do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo), Wilson Shoji Iyomasa.

Para grandes obras de infraestrutura, há necessidade de um trabalho interdisciplinar entre geólogos e engenheiros civis e, em alguns locais, até do apoio de geofísicos para o detalhamento da composição de diferentes materiais
geólogo Wilson Shoji Iyomasa

INTERDISCIPLINARIDADE E SUSTENTABILIDADE

É importante ressaltar que o nível de complexidade das investigações geotécnicas varia bastante conforme o tipo e o porte da obra a ser executada, além do solo encontrado no local.

“Para grandes obras de infraestrutura, há necessidade de um trabalho interdisciplinar entre geólogos e engenheiros civis e, em alguns locais, até do apoio de geofísicos para o detalhamento da composição de diferentes materiais”, afirma Iyomasa.

No caso de empreendimentos de menor porte, o engenheiro civil ou geólogo consegue realizar a análise dos dados coletados e oferecer bons resultados para a elaboração do projeto de fundações.

Um segmento que tem conquistado espaço nos últimos anos, com demanda crescente de investigações específicas, é a caracterização de áreas contaminadas para eventual remediação.

“É uma nova vertente da geotecnia ambiental, que reúne a colaboração de diferentes profissionais, além do engenheiro civil e do geólogo, tais como químicos e biólogos” afirma o Eng. Joaquim Teodoro Romão de Oliveira, professor da Universidade Católica de Pernambuco e sócio da Void Soluções Geotécnicas.

Mas quais são, afinal, as habilidades e competências necessárias para um jovem profissional que deseja ingressar na área de investigações geotécnicas?

1) CONHECIMENTO TÉCNICO E AFINIDADE COM AS DISCIPLINAS RELACIONADAS

Estamos falando de uma área central para a segurança das obras. Uma investigação inadequada ou – ainda pior – a falta dela costuma gerar consequências graves para as obras, com risco de acidentes, prejuízos e perdas de vidas humanas. Formação acadêmica e especialização na área são pré-requisitos.

Ser bom aluno, demonstrar interesse no tema e manter contato próximo com os professores das disciplinas relacionadas (geologia de engenharia, mecânica dos solos, fundações e obras de terra, geologia estrutural aplicada etc.) são fatores que ajudam na identificação de oportunidades e estágios, onde o aprendizado será ainda mais prático e efetivo. Seguem alguns conteúdos e livros de referência:

Manual de Sondagens – Associação Brasileira de Engenharia Ambiental
Obras de Terra – Curso Básico de Geotecnia – Faiçal Massad
Investigações Geológico-Geotécnicas: guia de boas práticas – João Jeronimo Monticelli
Ensaios de Campo e suas aplicações à Engenharia de Fundações – Fernando Schnaid e Edgar Odebrecht
Curso Básico de Mecânica dos Solos em 16 aulas – Carlos de Sousa Pinto
Manual de Investigação do Subsolo – Abel Galindo Marques
Canal da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos) no Youtube

2) HABILIDADE COM SISTEMAS

“Os graduandos precisam concluir o curso com mínimo de conhecimento no uso de softwares com sistemas georreferenciados, tais como AutoCad – 2D e 3D e ArcGis para elaborar desenhos e mapas, seções e perfis, calcular área e volume, realizar interpolações simples e estatísticas”, afirma Iyomasa. O assunto é tão relevante que o grau de habilidade com sistemas costuma ser uma das primeiras perguntas feitas durante entrevistas de estágio ou emprego na área. Também são requisitados softwares de visualização de dados de subsolos, como o RockWorks, ou de simulações ou modelagens numéricas e computacionais, tais como Plaxis, Leapfrog e Slope/W.

A atualização constante é mandatória nessa área. É preciso ser proativo e entender as demandas da sociedade, não apenas do ponto de vista técnico, mas também em relação aos aspectos de sustentabilidade, gestão e até de cultura
Eng. Joaquim Teodoro Romão de Oliveira 

3) INTERESSE E ACOMPANHAMENTO DE NORMAS TÉCNICAS

Um dos métodos mais utilizados no Brasil para investigações geotécnicas é a sondagem SPT, sigla em inglês para standard penetration test ou ensaio de sondagem à percussão. Está previsto e descrito na NBR 6484, uma norma técnica que deve ser examinada e conhecida por qualquer profissional interessado em atuar na área. Seguem abaixo outros textos relevantes, que precisam ser consultados e estudados:

NBR 6484 (2020): Solo – Sondagem de simples reconhecimento com SPT
NBR 15492 (2007): Sondagem de reconhecimento para fins de qualidade ambiental – Procedimento
NBR 7181 (2022): Solo – Determinação da resistência à compressão não confinada de solo coesivo
NBR 7250 (1986): Identificação e descrição de amostras de solos obtidas em sondagens de simples reconhecimento dos solos
NBR 9603 (2015): Sondagem a trado – Procedimento
NBR 6502 (2022): Solos e Rochas – Terminologia
NBR 7181 (2018): Análise granulométrica – Procedimento

4) APRENDIZADO CONSTANTE E CURIOSIDADE PROFISSIONAL

O austríaco Karl von Terzaghi, considerado o pai da engenharia geotécnica, defendia que o “bom senso e o exercício contínuo do espírito crítico” são essenciais para quem pretende atuar nessa atividade. Pode-se dizer o mesmo sobre a necessidade de pesquisar e aprofundar conhecimentos.

“A atualização técnica constante é mandatória nessa área”, afirma o professor Oliveira. “É preciso ser proativo e entender as demandas da sociedade, não apenas do ponto de vista técnico, mas também em relação aos aspectos de sustentabilidade, gestão e até de cultura. Ou seja, desenvolver uma visão holística da profissão”, completa o engenheiro.

É importante, por exemplo, conhecer o potencial e as eventuais limitações dos equipamentos de investigação, que estão cada vez mais sofisticados do ponto de vista tecnológico. “Há bons vídeos disponíveis na internet e nas redes sociais que podem auxiliar nesse sentido”, recomenda Iyomasa.

As pessoas também perguntam: Como se tornar um projetista de fundações?

5) BOM RELACIONAMENTO E TRABALHO EM EQUIPE

Como mencionado anteriormente, a multidisciplinaridade e a interação com profissionais de diferentes especialidades são constantes na área. Por isso, o interessado em atuar com investigações geotécnicas deve desenvolver a habilidade de se relacionar com outras pessoas e trabalhar em equipe.

Participar de eventos e congressos, interagir com outros especialistas, visitar empresas e obras ajudam no desenvolvimento profissional e devem fazer parte do cotidiano dos iniciantes – mesmo que, eventualmente, a pessoa tenha um perfil mais tímido e/ou analítico.

Veja, a seguir, algumas associações relacionadas à área que, além do networking, também são importantes como fontes de conhecimento:

Associação Brasileira de Geologia de Engenharia e Ambiental (ABGE)
Associação Brasileira de Mecânica dos Solos e Engenharia Geotécnica (ABMS)
Associação Brasileira de Empresas de Projetos e Consultoria em Engenharia Geotécnica (ABEG)
Associação Brasileira de Empresas de Engenharia de Fundações e Geotecnia (ABEF)

6) GOSTO PELO TRABALHO EM CAMPO

“Na investigação do subsolo, é necessário, literalmente, colocar a mão na massa, ou seja, manipular as amostras de solos e rochas e sentir a granulação, a densidade”, recomenda o pesquisador Iyomasa. A mecânica dos solos não é uma ciência exata e os profissionais devem aliar experiência acadêmica e vivência profissional, com o intuito de desenvolver a própria intuição a respeito das questões geotécnicas. O trabalho em campo é fundamental nesse aprendizado.

Carreira: qual é a sua sugestão de tema para o nosso espaço dedicado aos profissionais de Engenharia Civil, Arquitetura e Construção?

Colaboração técnica

Wilson Shoji Iyomasa – geólogo pelo Instituto de Geociências da Universidade de São Paulo. Mestre em geociências e meio ambiente pela UNESP de Rio Claro-SP. Doutor em geotecnia pela Escola de Engenharia de São Carlos da USP. Ex-docente de graduação de engenharia civil e ambiental, é coordenador do curso de especialização do IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de São Paulo) sobre investigação do subsolo, geotecnia e meio ambiente. Pesquisador do IPT, é colaborador do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação (MEC). Atua na área de geologia de engenharia e geotecnia na investigação de terrenos para obras de infraestrutura (barragens, túneis, rodovias, ferrovias e hidrovias).
Joaquim Teodoro Romão de Oliveira – Engenheiro civil pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), com mestrado e doutorado em engenharia civil pela COPPE/UFRJ. Realizou também estágio de pós-doutorado na Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Professor adjunto da Universidade Católica de Pernambuco, é engenheiro do Laboratório de Solos da Universidade Federal de Pernambuco. Conselheiro da ABMS (Associação Brasileira de Mecânica dos Solos) e sócio da Void Soluções Geotécnicas.