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Instalação de gases medicinais em hospitais exige conhecimento e cuidado

Essenciais à vida, esses elementos chegam ao paciente através de tubulações que identificam cada gás por uma cor padronizada e universal. Erros não são admissíveis

Publicado em: 28/07/2022Atualizado em: 05/08/2022

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

foto de um tanque de gás e um relógio em evidência
(Foto: Dizfoto/Reprodução)

Os gases medicinais são fundamentais em ambientes de saúde. Exigem projeto detalhado e cuidadosa instalação, de acordo com a NBR 12188:2016. Um bom projeto de arquitetura hospitalar contempla a planta dos pontos de luminárias, tomadas e gases medicinais. “Mas, na falta da planta, com um simples projeto de layout, o projetista consegue quantificar o número de pontos necessários”, explica o engenheiro Cléo Pais de Barros, professor na Pontifícia Universidade Católica (PUC-RJ) e titular da CJ Construções.

Em qualquer hospital com áreas de internação e cirurgia devem ser instalados quatro gases básicos: oxigênio medicinal, ar comprimido, óxido nitroso e produção de vácuo clínico. “Esses elementos são tão vitais para a vida quanto o fornecimento de água”, diz.

Nos hospitais de maior complexidade, somam-se outros elementos como nitrogênio, CO2 e outras misturas. As áreas mais críticas de consumo, em ordem decrescente, são o centro cirúrgico, a unidade de terapia intensiva (UTI) e as enfermarias.

Esses elementos são tão vitais para a vida quanto o fornecimento de água
Cleo Pais de Barros

Para que se tenha uma ideia da importância dessas instalações, o engenheiro explica a função de cada um deles:

• Oxigênio e ar comprimido estão presentes em todos os hospitais, independentemente da complexidade;
• Vácuo clínico é usado para a limpeza das secreções dos doentes. Nos hospitais de menor porte, essa rede pode ser substituída por bombas de vácuo individuais;
• Óxido nitroso, empregado em centros cirúrgicos, é misturado ao oxigênio e anestésicos promovendo a recuperação mais rápida dos pacientes;
• CO2 tem uso em cirurgias por laparoscopia;
• Nitrogênio é o elemento propulsor dos equipamentos de corte usados nos hospitais de urgência e emergência.

Esses gases são produzidos por empresas especializadas, em geral, dentro de uma planta industrial terceira. Atualmente, os hospitais têm a possibilidade de produzir seu próprio oxigênio, utilizando as Usinas Concentradoras de Oxigênio que são implantadas na unidade. “Esse sistema é conhecido como Pressure Swing Adsorption (PSA), porém, apesar do seu custo viável, o consumo de energia elétrica é altíssimo”, diz.

Dimensionamento do sistema

Com base em dados estatísticos, a NBR define o número de pontos de gases medicinais para cada ambiente do hospital. “Por exemplo, nas enfermarias, é preciso ter um ponto de oxigênio para cada leito. Na UTI, são dois pontos por leito e, nos centros cirúrgicos, são três pontos de oxigênio em duas paredes opostas”, informa Pais de Barros.

Para dimensionar a quantidade total de pontos de gases medicinais numa unidade de saúde é preciso somar todos os ambientes e seus pontos. “A norma estabelece o consumo em litros/minuto para cada ponto. Por exemplo, se um hospital tiver cem pontos, deve multiplicá-los por determinado número de litros/minuto para obter a quantidade total de cada um desses gases. Assim, as linhas centrais de oxigênio, ar comprimido, óxido nitroso e de vácuo serão dimensionadas para aquela quantidade total de pontos”, ensina.

Considerando que, dependendo do ambiente, nem todos os pontos serão usados ao mesmo tempo, a norma técnica determina a aplicação de um fator de simultaneidade para cada um. “Numa sala de inalação, por exemplo, o fator de simultaneidade é de 100%. Já na UTI, é de 80%, ou seja, mesmo que a unidade esteja totalmente ocupada, a probabilidade é que 20% dos pontos de gases não estarão em uso. Se necessário, os 100% estarão disponíveis”, expõe.

O uso dos pontos durante a pandemia de Covid-19 saiu fora da curva, principalmente em leitos de UTI. “Praticamente todos os pacientes nessas unidades estavam intubados, e o número de pontos de gases e de tomadas foi aquém do necessário”, fala. Esses números são preconizados pela RDC-50, de 2002, do Ministério da Saúde. O órgão agora estuda uma revisão da diretriz para que, no futuro, sob eventual nova crise sanitária, não se repita o registrado nos momentos mais críticos da pandemia.

Instalação das redes

O oxigênio pode ser fornecido aos hospitais na forma líquida armazenado nos tanques criogênicos, ou na forma gasosa, em cilindros de alta pressão (balas). Cada 1 m³ de oxigênio líquido equivale a 80 m³ do gasoso. “Quando a instituição tem um consumo semanal superior a 100 m³, é financeiramente conveniente à empresa fornecedora transportar o gás na forma líquida”, aponta o especialista.

Nos hospitais, a central deve estar, obrigatoriamente, localizada fora do edifício e no nível da rua, em doca de fácil acesso aos caminhões que fazem o abastecimento. As tubulações que transportam os gases da central até os leitos são de cobre (classe A), material com menos rugosidade interna, o que facilita a fluição.

“As tubulações sobem verticalmente no edifício, através de shafts. São distribuídas pelo teto dos corredores, vetores de todas as instalações, e vão abastecendo as enfermarias, centros cirúrgicos, UTIs e demais ambientes. Mas, antes, passam por um quadro localizado no corredor, onde estão as válvulas de seção que abrem e fecham trechos específicos. Por exemplo, a válvula da linha que leva oxigênio para a UTI, ou qualquer outro ambiente, pode ser fechada pontualmente para o serviço”, explica Pais de Barros, complementando que esse dispositivo fica dentro de caixas lacradas para evitar a situação impensável de desligamento da rede, o que deixaria o hospital todo sem gás.

Quando a instituição tem um consumo semanal superior a 100 m³, é financeiramente conveniente à empresa fornecedora transportar o gás na forma líquida
Cleo Pais de Barros

Recurso de grande valia na rede de oxigênio é a redundância na central de fornecimento dos pontos de consumo. Assim, se acaba o oxigênio no atendimento primário da central, automaticamente entra em operação o secundário. Na falta desse, entra o reserva e, numa situação mais grave, é possível recorrer às balas de emergência. “Ambientes de saúde podem ficar algum período sem água ou sem eletricidade, até porque há outros meios de prover esses insumos. Mas, em hipótese alguma, podem ficar sem oxigênio”, alerta.

Instalação exige cuidados

O principal desafio na rotina de instalação da rede é a correta identificação de cada gás medicinal. O procedimento leva em conta as cores das tubulações e dos cilindros, inclusive nos terminais localizados na parede atrás dos leitos. São cores padronizadas por norma técnica e de caráter universal. Por exemplo, o oxigênio é identificado pela cor verde; o ar comprimido, amarelo; o vácuo, cinza; o óxido nitroso, azul marinho.

“Já houve relatos de instalação feita em um determinado leito de UTI de um hospital, cometer o erro de ligar a tubulação que era de oxigênio no terminal de ar comprimido e vice-versa. O que só foi percebido pela equipe médica da UTI pelas reações e até óbitos de pacientes”, relata Pais de Barros, que alerta: “É preciso ter cuidado extremo na execução da obra. E o principal, quando o edifício estiver pronto, no comissionamento das instalações deve testar ponto a ponto se o que foi executado corresponde ao projetado”.

Manutenção

O especialista defende que a manutenção não começa somente quando o prédio já se encontra em operação, mas na fase da concepção do projeto. É a chamada manutenção passiva, que abrange fatores como o tipo de estrutura, tendo em vista a menor possibilidade de vigas nos pavimentos para permitir a passagem das tubulações. E, também, o partido arquitetônico, pensando sempre em facilitar a manutenção em todas as instalações, desde os gases medicinais à água gelada e ar-condicionado, entre outras.

“Fazer a manutenção de um shopping center ou de uma escola é relativamente mais fácil, porque há períodos inteiros em que esses prédios estão fechados para o público. Já em unidades de saúde, é o mesmo que trocar um pneu com o carro andando. As ações de manutenção só são possíveis se tiver um bom projeto de arquitetura, desenvolvido com um olhar atento às exigências de manutenção”, ensina Pais de Barros.

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Colaboração técnica

Cleo Pais de Barros – É Engenheiro Civil, com aperfeiçoamento em Engenharia Sanitária. Especialista em Engenharia de Manutenção, em Gestão de Recursos Físicos e Tecnológicos pela Fiocruz. É professor nos cursos de pós-graduação em Arquitetura Hospitalar, Clínicas e Laboratórios do Instituto Brasileiro de Educação Continuada – INBEC, e de pós-graduação em Arquitetura em Ambiente de Saúde da PUC-RJ. Ocupa a vice-presidência Administrativa e Financeira da Associação Brasileira para o Desenvolvimento do Edifício Hospitalar – ABDEH.