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Construção modular ganha terreno no Brasil

Os módulos são produzidos em fábrica com estruturas que vão da metálica e do concreto pré-fabricado à madeira engenheirada e, depois, transportados até o canteiro onde são montados

Publicado em: 27/05/2021Atualizado em: 28/06/2021

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

Construção modular
O Level é o primeiro edifício de multipavimentos do tipo em toda América Latina (Foto: Divulgação/Brasil ao Cubo)

Aos poucos, mais lentamente do que gostariam os defensores da industrialização, a construção modular vai se impondo no Brasil. “Novos players em construção modular estão surgindo para transformar a construção numa indústria moderna e eficaz em nosso país. Já embarcamos no futuro!”, comemora o engenheiro Paulo Oliveira, CEO da Aratau Construção Modular – startup do setor. Para o engenheiro Ricardo Mateus, CEO e fundador da empresa Brasil ao Cubo (no mercado desde 2016), a indústria da construção civil é uma das poucas que não ocorre tradicionalmente dentro de uma fábrica. “Mas a construção off-site veio para mudar essa realidade, possibilitando novos modelos de negócio”, diz.

Novos players em construção modular estão surgindo para transformar a construção numa indústria moderna e eficaz em nosso país. Já embarcamos no futuro
Paulo Oliveira

A construção modular é uma forma de construção em que partes ou seções repetidas de uma edificação (módulos) são produzidos em uma fábrica (off-site). Os módulos são então transportados e montados no local da obra (on-site), podendo ser dispostos lado a lado ou empilhados, permitindo uma variedade de configurações e estilos, formando a edificação. “Quanto maior a parte do processo realizada off-site, melhor a qualidade e a segurança no atendimento dos prazos e dos custos planejados”, assegura Oliveira, lembrando que é no canteiro de obra que acontecem os principais problemas decorrentes de variação de condições climáticas e gestão de grande contingente de mão de obra direta.

Os engenheiros Paulo Oliveira e Ricardo Mateus foram dois dos palestrantes da AECweb Conference: assista à gravação do evento

“A construção modular usa tecnologia projetada do zero, com engenharia e arquitetura especializada, promovendo uma obra de alta qualidade, com a vantagem de ser, em média, quatro vezes mais rápida do que o processo construtivo convencional”, destaca Mateus. Na fábrica, as etapas são padronizadas e parametrizadas. Assim, há como garantir uma entrega assertiva no prazo, ou até antes dele, com a garantia de que não haverá surpresas ou aditivos indesejados durante a fabricação. “Além disso, o desperdício é drasticamente reduzido, gerando menos resíduos e menor impacto ambiental”, diz.

Estrutura e fechamentos

A construção modular usa tecnologia projetada do zero, com engenharia e arquitetura especializada, promovendo uma obra de alta qualidade, com a vantagem de ser, em média, quatro vezes mais rápida do que o processo construtivo convencional
Ricardo Mateus

A estrutura dos módulos é identificada por Oliveira como “chassi”, devido à grande semelhança com o processo de montagem de um carro. Os principais tipos de chassi utilizados são em estrutura metálica pré-fabricada; estrutura de concreto pré-fabricada, Light Steel Framing (LSF), Wood Framing e de Madeira Engenheirada (MLC – Madeira Laminada Colada). Segundo ele, há muitas opções de painéis de fechamento (ou vedação) para uso externo e interno. As soluções abrangem concreto pré-fabricado, concreto celular autoclavado – muito mais leves e com características interessantes, mas não disponível ainda no Brasil –, GRC (Glass Reinforced Concrete), metálico, de Madeira Engenheirada (CLT – Cross Laminated Timber), madeira, painel “Wall”, vidro, isotérmicos, ACM, placas cimentícias e drywall.

A Brasil ao Cubo trabalha com construção metálica, ou seja, todos os módulos são estruturados em aço. “Para o fechamento, utilizamos isopainel nas paredes externas, garantindo conforto termoacústico. É possível deixar o isopainel aparente ou utilizar diferentes tipos de materiais de acabamento externo como madeira, tijolos, ACM, placa cimentícia, entre outros. Há liberdade para criação arquitetônica, não limitando a criatividade”, ressalta Mateus.

Para Oliveira, embora muitas empresas se especializaram em sistemas construtivos específicos, o ideal é a combinação entre os diversos tipos de chassi e de painéis. “Essa solução gera flexibilidade de múltiplas opções, que devem ser criteriosamente analisadas e escolhidas para cada condição de uso, tipologia e características de cada projeto, considerando custos, prazo de fabricação e montagem, condições de içamento, transporte e montagem e, ainda, o partido arquitetônico”, recomenda.

A construção modular aceita tanto os sistemas convencionais de instalações prediais quanto os industrializados. Na Aratau, são considerados exclusivamente kits hidráulicos prontos, sistema PEX e chicotes elétricos, fazendo as ligações entre os módulos com conectores, num sistema limpo, rápido e “plug & play”.

Vantagens da construção modular

Oliveira elenca as principais vantagens da construção modular em relação às práticas tradicionais:

• Processos padronizados e controlados, com alta produtividade e economia de escala;
• Maior controle do projeto e da construção;
• Rapidez e previsibilidade de custos e prazos (o que não acontece na construção tradicional);
• Menor custo de manutenção e operação;
• Qualidade e desempenho superiores;
• Redução de riscos e do retrabalho;
• Montagem rápida (on-site);
• Maior flexibilidade e adaptabilidade às necessidades dos clientes;
• Possibilidade de as edificações serem realocáveis, se esta for uma exigência do projeto.

Mateus destaca que, sendo até quatro vezes mais rápida do que a convencional, a construção modular permite ao cliente iniciar suas operações em um período bem mais curto, possibilitando ao empreendimento integrar o mercado e começar a faturar muito antes do que na construção convencional. Prazos e custos são previsíveis com a modular, possibilitando maior controle sobre o investimento na obra. “Sem atrasos ou acréscimos indesejados”, frisa.

Vale dizer, ainda, que canteiro se torna mais seguro com o trabalho in loco reduzido. “Diminuímos o tempo e quantidade de pessoas no canteiro, o que beneficia o acompanhamento dos técnicos de segurança, reduz riscos e minimiza a intervenção nas atividades locais”, comenta Mateus. Por fim, a construção modular tem a vantagem da realocação, ou seja, da mesma forma que são transportados da fábrica para o terreno, os módulos também podem ser transferidos para um novo endereço sem perda significativa de materiais. “Desta forma, o sistema permite que o terreno seja alugado, pois é possível realocar o módulo em um outro espaço, evitando a perda do investimento”, fala Mateus.

Entre as propriedades do sistema modular, a sustentabilidade é protagonista. “Com a construção modular as obras se tornam mais eficazes e sustentáveis, com baixo nível de resíduos, poeira e ruído e, ainda, menor emissão de carbono e menor consumo de água e energia no processo de construção”, explica Oliveira. De acordo com Mateus, a própria modularidade do projeto já evita que haja desperdícios, até porque são feitas as paginações de uso dos materiais, onde, desde o início, tudo é calculado. “Quase não se usa água nos processos, pois utilizamos materiais industrializados como laje seca, estrutura metálica e painéis como ACM, isopainel, OSB e gesso acartonado”, diz.

Liberdade arquitetônica

“A construção modular assegura total liberdade de criação pelos arquitetos, permitindo todo tipo de personalização, desde materiais de acabamento até formatos”, comenta Mateus, lembrando que é preciso que o projeto respeite as dimensões máximas, para possibilitar o transporte até o canteiro. Os módulos podem ter diferentes formatos, não exigindo ângulos necessariamente retos. Porém, por economia nos custos decorrentes do aproveitamento de materiais e transporte, a maioria dos módulos é fabricada na empresa com formatos retangulares. Os volumes das fachadas com outras formas geométricas podem ser gerados a partir de sistemas acessórios, como brises, pergolados, platibandas e fachadas ventiladas.

Oliveira reforça que a repetição de módulos não precisa estar relacionada à repetição de produtos. “Hoje, a ampla disponibilidade de revestimentos favorece a diferenciação entre os projetos. Bons arquitetos e escritórios de arquitetura têm realizado um valioso trabalho para dar personalidade a ótimos produtos e empreendimentos em construção modular, no mundo todo”, frisa.

Obras no Brasil

O Brasil ainda é um território novo para a construção modular. “Há empresas estruturadas há algum tempo e em franca expansão, mas temos problemas seríssimos a enfrentar, como um déficit habitacional de 30,7 milhões de unidades, projetado para 2030”, afirma Paulo Oliveira. Ele entende que, sem a industrialização da construção e a construção modular, não há solução para um problema dessa magnitude. “Somos um país pobre que precisa fazer muito mais com menos recursos. Nesta direção, os ganhos de produtividade e de qualidade, a redução de custos, a rapidez e a previsibilidade de custos e prazos são muito bem-vindos”, ressalta.

Ricardo Mateus constata que o mercado das construções modulares está em pleno crescimento. A pandemia da Covid-19 passou a exigir obras com menor tempo de execução e maior segurança nos canteiros, e a resposta veio da construção off-site. Em 2020, a empresa entregou cinco hospitais em 115 dias, com 333 leitos, e já tem novas obras contratadas para este ano. “Estamos finalizando o Edifício Level, o primeiro edifício de multipavimentos do tipo em toda América Latina, com 8 pavimentos montados em apenas 60 dias em Tubarão (SC)”, relata, acreditando que esse segmento de edificação terá um grande destaque na construção modular.

Paulo Oliveira acumula experiência com obras off-site na condição de ex-diretor das construtoras Método e JHSF, incluindo mais de 33 casas de alto padrão na Fazenda Boa Vista, o Outlet Catarina e alguns prédios residenciais. “Na Aratau, desenvolvemos casas em módulos 3D + 2D, objeto de engenharia inteligente, explorando o BIM e ferramentas de pré-construção e fast-construction”, diz. O primeiro projeto de porte da startup, assinado pelo escritório FGMF, envolve a construção de residências de alto padrão no interior de São Paulo.

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Colaboração técnica

Paulo Oliveira
Paulo Oliveira – Graduado pela Faculdade de Engenharia Civil de Itajubá–MG e pós-graduado em várias disciplinas pela POLI/USP, com MBA Executivo Internacional pela FIA/USP, Project Manager Professional (PMP) pelo PMI e mestrando do programa em Inovação na Construção da POLI/USP. Durante 15 anos foi diretor das empresas de engenharia, construção e incorporação: Método, Brookfield/TEGRA, JHSF e Mutual, tendo sido CEO de Incorporações da JHSF e CEO da Mutual. E por 20 anos atuou na direção das indústrias nacionais e multinacionais de produtos para a construção: Fosroc, Denver e Sika. É especializado em Patologia e Terapia do Concreto, Grautes e Revestimentos de Alto Desempenho para Pisos (UK e USA). Professor convidado dos cursos de Mestrado do IPT, bem como de graduação e pós-graduação da FGV, Mackenzie, Poli-Integra e FAAP. Tem mais de 50 trabalhos técnicos publicados no Brasil e no exterior e foi presidente da Associação Brasileira da Construção Industrializada (ABCI). É membro do Núcleo de Conteúdo e do Conselho do C3 - Clube da Construção Civil e CEO da ARATAU Construção Modular.
Ricardo Mateus
Ricardo Mateus – Formado em Engenharia Civil pela UNISUL (2009) e em Engenharia de Produção pela FUCAP (2013). Iniciou em 1999 sua trajetória profissional como soldador e montador de estruturas metálicas, desempenhando tais funções por cerca de 10 anos na empresa da família. Apaixonado por inovação, buscou conhecimento e qualificação para fundar, em 2016, a Brasil ao Cubo (BR3), construtech de soluções construtivas ágeis, pioneira em construção off-site volumétrica no país. Hoje, a Brasil ao Cubo tem obras espalhadas em diversos estados brasileiros e é reconhecida pela excelência ao conduzir e executar projetos de forma rápida e eficiente.