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Conforto acústico pede massa

Basicamente regido pela massa, o isolamento acústico nas construções não lança mão de materiais leves<br>

Publicado em: 08/07/2009

Texto: Redação AECweb


Conforto acústico pede massa

Redação AECweb

As construções antigas, robustas e pesadas, respondiam a um só tempo pelo conforto térmico e acústico. Daí vem o uso, às vezes, equivocado da expressão ‘isolamento termoacústico’. “Geralmente, os materiais isolantes térmicos não são isolantes acústicos. Por questões econômicas e estruturais, nem sempre é possível realizar os isolamentos acústico e térmico usando muita massa, como ocorria nas construções antigas. As paredes e lajes, antes maciças, ganharam materiais mais leves, como blocos cerâmicos, laje alveolar e sistema drywall. Junto, vieram materiais ainda mais leves com a propriedade de isolamento térmico – o poliestireno, as lãs minerais, de vidro e de rocha.”, comenta o consultor Davi Akkerman, sócio-diretor técnico da Harmonia Acústica.

“Para conseguirmos o isolamento acústico nas construções, não se pode lançar mão de materiais leves. Essas lãs são coadjuvantes, porque o isolamento acústico é, basicamente, regido pela massa – é a chamada ‘lei das massas’. Existe uma linearidade entre performance de isolamento e ganho de massa”, explica o consultor. Respeitar essa ‘lei’ para ambientes em que o isolamento acústico é crítico, como em salas de espetáculo ou em estúdios de gravação, chega a ser condicionante para o projeto arquitetônico.

A premissa é defendida por outro consultor, o arquiteto José Augusto Nepomuceno, diretor do escritório Acústica & Sônica. “Nesses casos, não adianta o arquiteto desenvolver o projeto com paredes fininhas e, no final, outro profissional em acústica solicitar que a parede tenha 40 cm de concreto”, alerta, ressalvando que, em edifícios comerciais, hotéis e nos demais espaços onde as exigências são menores, os projetos de arquitetura e de acústica podem ser realizados em conjunto.

Conforto acústico pede massa

Ruído ‘intruso’
No ano passado, a aprovação da Norma de Desempenho das Edificações ampliou o conhecimento contido na NBR 10152 (Níveis de ruído para conforto acústico) da ABNT, ao oferecer bons parâmetros para construtores e consumidores. Datada de 1987, a NBR 10152 deverá ser revisada em breve, de acordo com Akkerman, membro do comitê de revisão representando a Sobrac - Sociedade Brasileira de Acústica que pleiteia sua atualização. “A norma estabelece uma faixa de ruído para cada tipo de ambiente, do hospitalar ao escolar, dos dormitórios aos teatros. Em ambientes como dormitórios, o nível de ruído recomendado varia de 35 a 45 dB(A). Num estúdio de gravação, a indicação é de 25 dB(A)”, afirma.

Para se obter esse nível mínimo, Nepomuceno defende o uso de parede de concreto produzido ‘in loco’. “Já realizei serviços de acústica em caixas de teatro e envelopes de teatro com paredes duplas de alvenaria e, também, com paredes monolíticas de concreto. A escolha varia de acordo com a arquitetura e com os métodos construtivos. Edificações que têm maior demanda de isolamento acústico utilizam paredes de concreto produzido ‘in loco’. São paredes de alta expressão em termos de peso”, diz o arquiteto.

Porém, quando se trata de um edifício residencial, as providências acústicas em excesso podem acarretar incômodo diante de qualquer tipo de ruído ‘intruso’. Akkerman relata o ‘case’ de um apartamento em edifício de alto padrão, localizado em avenida movimentada de São Paulo, com ruído externo muito forte. “O proprietário solicitou que a construtora adotasse mecanismo de isolamento acústico em seu apartamento. As janelas foram bem dimensionadas, com vidros especiais e uma performance fantástica, em que o nível do ruído interno do apartamento ficou de 27 dB(A) – aquele indicado para estúdios de gravação. Mas, o vizinho do andar de cima tinha crianças e o barulho prejudicava extremamente este proprietário. Nessa situação, seria melhor ter menos isolamento da janela - o que chamamos de ruído de fundo que vinha da rua -, para mascarar outros ruídos internos do apartamento e da vizinhança”, explica, acrescentando que, “se esse prédio tivesse proteção bem dimensionada nas lajes e nas paredes, o resultado seria um desempenho superior”.

Do robusto ao esbelto

O silêncio tem preço e depende muito da localização da edificação. O estudo do entorno do terreno será fundamental para definir procedimentos e tecnologias a serem adotas, das lajes às paredes e caixilharia. “A construtora procura sempre os sistemas mais econômicos. A participação do projetista de acústica pode ser decisiva para a redução de custos”, observa Akkerman. Esse profissional pode, por exemplo, intervir no projeto arquitetônico, alterando o posicionamento das janelas em relação à rua, em benefício da acústica. Outra questão do caráter estrutural diz respeito ao tipo de laje utilizado no edifício. “Em construções de prédios populares, são usadas lajes de 8 cm de espessura e, às vezes, sem contra piso, quando o mínimo aceitável é de 10 cm. Quanto mais esbelta a laje, pior é o isolamento acústico na transmissão do ruído de impacto”, diz ele.

A laje ideal, segundo ele, não precisa ser a utilizada na Coréia e no Japão - maciça de 25 cm – mas, tem que ter massa mínima. “A laje ideal pode ter de 10 cm a 12 cm e, sobre ela, uma manta de lã de vidro, lã de rocha, espumas, aglomerados de borracha e outras opções. Em cima dessa manta acústica, vem o contrapiso, com 4 cm ou 5 cm. Se o construtor tiver esta precaução e puder fazer um piso flutuante, a performance será excelente e o desempenho, no mínimo, entre intermediário e superior, com custo relativamente baixo”, ensina. Entre os revestimentos de piso, o consultor diz que uma boa opção é o piso laminado de madeira sobre manta acústica, oferecida pelos fabricantes como acessório opcional.

Para erguer paredes, o brasileiro não abre mão de elementos convencionais, como tijolos e alvenaria. “Ele não acredita em drywall, mas este sistema pode ser uma solução acústica interessante, pois é leve, de fácil execução, inovador e com muitas propriedades. Exige, apenas, precauções de instalação nas vedações e espessuras de chapas”, comenta Akkerman. A indústria de drywall oferece testes acústicos para várias combinações construtivas. A espessura das paredes pode variar de 7 cm a 30 cm , com composições variadas de lã mineral, preenchendo toda a cavidade ou não. Mesmo as cavidades podem ter dimensões diversas, de 5 cm a 20 cm , assim como o número de chapas de cada lado. “Dependendo da composição, é possível obter o isolamento acústico e, também, o térmico”, lembra José Augusto Nepomuceno, exemplificando: “A lã mineral inserida no interior cavidade e uma parede dupla de drywall, atinge os dois objetivos”.

Conforto acústico pede massa

Caixilharia e vidro
Nos edifícios corporativos, os construtores primam pela diferenciação, o que inclui preocupações com o conforto acústico. A definição da caixilharia e dos vidros será fundamental para reduzir a carga térmica do ar condicionado e, ao mesmo tempo, obter um bom controle acústico. Essa é a parte construtiva mais cara do projeto acústico, podendo variar de 5% a 20% sobre o custo total da obra. “Depende da opção por caixilhos de perfis mais robustos e da linha que será utilizada, além, é claro, dos vidros”, diz Davi Akkerman que chama a atenção para um detalhe interessante: num ambiente de trabalho não é necessário atingir os 35 dB(A) exigidos para dormitório de edificação residencial, podendo ter um ruído de fundo de 45 a 50 dB(A), considerado índice excelente.

Entre vidros laminados, duplos insulados ou fachadas duplas, os consultores são unânimes quanto à regra de que o vidro laminado é parceiro da acústica. A questão se volta para a definição das espessuras e número de chapas de vidro e das possíveis composições com o PVB (polivinilbutiral) – inclusive com o PVB acústico. “O vidro laminado é a melhor solução em 90% dos casos, enquanto que o vidro duplo insulado não é recomendável para o isolamento acústico de ruídos de baixa freqüência. O problema é que os ruídos do tráfego urbano e dos aviões têm um grande componente de baixa freqüência. Esse vidro perde eficiência diante da baixa freqüência, apesar de isolar bem a partir da média para alta. Além disso, atua no isolamento térmico. Para obter uma boa performance acústica, o vidro insulado precisa ter uma câmara de ar de cerca de 10 cm. Na Europa, encontramos janelas com afastamento de 15 cm entre os vidros, o que é fantástico para o isolamento térmico e acústico”, ensina.

“Posso assegurar que, nos edifícios comerciais, o uso de vidros laminados de até 14 mm resolvem perfeitamente a questão acústica”, afirma, categórico, Nepomuceno. Ele conta que ao realizar um estudo para o hospital Santa Catarina, na avenida Paulista, concluiu que os vidros na faixa de 11 mm ou 12 mm seria o ideal acústico. “E veja bem, para um hospital, local que pede silêncio”, comenta. Na mesma avenida paulistana, está prevista a construção do prédio do SESC, com sistema de fachada ventilada, segundo Akkerman. “Essa é uma solução cara, porém de alta eficiência térmica e acústica. Teremos um painel de vidro, depois um grande recuo, depois a outra fachada”, diz.

A arquitetura de interiores também deve considerar o aspecto acústico na escolha dos materiais. “Agora falamos em absorção acústica - outro fenômeno físico em que as ondas sonoras são parcialmente absorvidas por elementos como as lãs minerais, as espumas, as fibras minerais, tecidos, estofados, tapetes. Quanto mais rígido e denso é o material, menos absorvente e mais refletor será, como os vidros, metais, alvenaria, gesso, madeira”, diz.

Redação AECweb
Colaboraram para esta matéria:

Davi Akkerman
Engenheiro Civil pela Universidade Mackenzie, em 1978. Mestrado em Building Acoustics, sob supervisão do profº Frank Fahy no "Institute of Sound and Vibration Research" da "University of Southampton" Inglaterra, em 1980. Possui especialização em Controle de Ruído Industrial - IPT-SP; Vibrações de Sistemas Mecânicos - FDTE/EPUSP/IPT; Curso de Treinamento Intensivo Técnico de Instrumentação e Medições Sonoras na Brüel & Kjær – Dinamarca; Membro Eleito do "Institute of Acoustics" - Grã-Bretanha; Conselheiro da Sobrac – Sociedade Brasileira de Acústica.

Atuou como Sócio-Diretor Técnico da Acústica Engenharia S/C Ltda. de 1981 a 1993. Em 1994, fundou a Harmonia Acústica Ltda, empresa de projetos e consultoria de acústica aplicada às edificações e controle de ruídos para o meio ambiente.

Jose Augusto Nepomuceno
, arquiteto, especialista em acústica é consultor principal da Acústica & Sonica, com importantes projetos no Brasil e no Exterior.