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Bambu pode suportar carga superior à do próprio aço

Quando comparados os valores médios de resistência à tração do bambu sobre o próprio peso ele se revela o aço verde da construção

Publicado em: 26/06/2014Atualizado em: 31/03/2023

Texto: Redação AECweb/e-Construmarket

Bambu

O aço é um dos materiais mais empregados na construção civil e pode ser utilizado de diferentes formas e em diversas solicitações de carga. “O bambu possui características muito parecidas com o aço. Sua resistência às forças de compressão e tração é muito alta, podendo ser usado – se devidamente calculado – simultaneamente, para esses dois esforços. Quando comparados os valores médios de resistência à tração do material sobre o peso próprio, percebemos que o bambu é capaz de suportar o equivalente e, em alguns casos, até uma carga maior que o aço”, explica o engenheiro civil Vitor Hugo Silva Marçal, secretário Executivo da Associação Brasileira de Produtores de Bambu (ABPB).

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Um dos fatores que atribuem ao bambu o slogan de aço verde é a facilidade de obtenção do material, com resistências físico-mecânicas mínimas normalizadas para a construção civil, em apenas poucos metros quadrados de plantio. Outra vantagem é a taxa de rebrota anual, que viabiliza a colheita periódica sem prejudicar a plantação. Ao contrário, quanto mais ele é cortado, mais tende a propagar-se.

SISTEMAS CONSTRUTIVOS

O bambu é um material tão especial que possibilita seu uso em conjunto com diferentes materiais como bambu e terra, bambu e cimento e bambu e vidro. Outra maneira de utilizá-lo é mudando sua forma circular para esteiras

Vários sistemas construtivos podem utilizar bambu. “O mais simples, mas não menos eficiente, é seu uso in natura ou roliço. Países como Colômbia, Peru, Equador, Indonésia e Índia possuem estruturas projetadas e executadas utilizando o bambu roliço. Existem estruturas centenárias na Colômbia que ainda são habitadas e não apresentam patologias estruturais graves”, diz o engenheiro. Porém, o bambu é um material tão especial que possibilita o uso de diferentes formas e em conjunto com variados materiais como bambu e terra, bambu e cimento e bambu e vidro. Outra maneira de utilizá-lo é mudando sua forma. “Com o devido conhecimento, a aparência circular pode ser alterada para esteiras de bambu, que ainda possuem todas as fibras e, consequentemente, grande parte da resistência físico-mecânica, porém com maior flexibilidade”, afirma Marçal.

É possível ripá-lo, transformando-o em pequenas travessas longitudinais com flexibilidade e grande resistência à tração. E, ainda, desenvolver trançados, estruturas em casca, com formas orgânicas e feixes de ripas unidas entre si. “Um dos mais interessantes sistemas construtivos com esse material é aquele no qual utilizamos o bambu laminado colado, ou o industrializado ou, ainda, a madeira de bambu”, ressalta. Um exemplo disso é a China, onde são fabricados inúmeros tipos de madeiras bambu, com diferentes tipos de laminação, colagem, posicionamento, resistências, flexibilidade, formas e tonalidades.

Marçal ressalva que deve haver cautela quanto ao número de pavimentos na construção. “O bambu possui resistência para ser utilizado em estrutura de mais de dois pavimentos sem maiores problemas. Porém, os sistemas conectivos e os sistemas construtivos utilizados devem ser muito bem projetados. Em edifícios de múltiplos pavimentos, o indicado é que o bambu seja empregado em conjunto com outros materiais como o aço e o concreto. Mas nada impede que possa ser desenvolvida uma estrutura de vários pisos somente em bambu, desde que todas as normas de projeto e garantia da qualidade do produto e mão de obra de execução sejam seguidas”, explica.

NORMAS TÉCNICAS

Existem algumas normas internacionais para a construção civil que fornecem informações sobre o emprego de peças de bambu com função estrutural, de forma única ou em conjunto – a partir da união entre mais de duas peças. “É imprescindível o conhecimento sobre o bambu utilizado na obra e qual é a necessidade de carga que precisa suportar. Algumas espécies da planta, como o Dendrocalamus asper, suportam tranquilamente cargas elevadas em peças de colunas com apenas uma vara de bambu. Outras, como o Phyllostachys aurea, devem ser aplicadas em conjunto, para garantir, com segurança mínima, cargas de projeto por mais simples que sejam. Logo, é muito difícil estimar parâmetros mínimos gerais para esse tipo de estrutura, porque esses valores são diretamente proporcionais ao bambu utilizado e aos sistemas estruturais empregados”, ensina.

CONEXÕES

Dependendo do tipo de construção, é possível diminuir o custo de uma estrutura de bambu em 50%, se comparado a uma estrutura convencional

Existem diferentes tipos de conexões entre peças de bambu. Algumas são simples, feitas diretamente entre as peças, outras utilizam pinos e parafusos fabricados do próprio bambu, de madeira ou aço. Há, ainda, sistemas avançados de conexão projetados para tipos de ligações específicas e estruturas que demandam esses sistemas conectivos.

“Por mais que existam muitas preocupações com o insert utilizado, é primordial entender como os esforços atuam no sistema conectivo. A falta de conhecimento pode resultar em colapsos na própria ligação, ou no bambu, sem que os inserts sejam necessariamente demandados. O bambu possui um sistema de fibras que facilita o cisalhamento. Por isso toda e qualquer ligação entre as peças leva em consideração os esforços atuantes e como eles podem prejudicar a ligação entre as peças solicitadas. Na maioria dos casos, os inserts e o bambu se comportam de forma semelhante, se devidamente projetados, assegurando eficiência e qualidade estrutural”, expõe Marçal.

COBERTURA E FECHAMENTO

Atualmente qualquer tipo de fechamento e cobertura pode ser agregado às estruturas de bambu. No entanto, os sistemas construtivos e o material utilizado precisam ser compatíveis com as escolhas feitas em projeto para esses elementos. Segundo o engenheiro, o cálculo estrutural deve considerar o tipo de cobertura escolhida. Já o sistema de travamento e sustentação precisa levar em conta o tipo de fechamento especificado.

Marçal exemplifica: “Uma construção com estrutura em bambu, na qual foi especificado sistema de travamento lateral com angulação de 45°, saindo do piso e terminando no ponto médio da viga de suporte do telhado, deverá evitar usar fechamento com tijolo furado. Caso isso aconteça, a parte acima da peça inclinada de bambu perderá a continuidade com o piso, e os tijolos não se suportarão. O mesmo serve para o tipo de cobertura: uma construção projetada para empregar um telhado ecológico leve não poderá optar por um teto verde, porque é bem provável que a estrutura não suporte as cargas e sofra variação de forma, podendo entrar em colapso por falta de resistência de projeto”.

FUNDAÇÕES

Acabamentos bem feitos oferecem padrões estéticos e detalhes que tornam uma estrutura de bambu uma obra de arte em poucos dias

O peso estrutural do bambu é menor que o de outros elementos, como o concreto armado e as estruturas de aço. As fundações projetadas para estabilizar obras feitas em bambu devem levar em consideração alguns fatores favoráveis a aumentar sua vida útil e assegurar melhor rigidez estrutural à obra. “Estamos falando de um material com maior rigidez em sua parte externa e interior oco. Para projetar as fundações deve-se afastar ao máximo o bambu do piso, evitando contato com a umidade do terreno. Isso também dificulta a incidência de chuva e ventos nas peças estruturais de bambu”, orienta.

Segundo Victor Marçal, há formas para melhor assegurar a ligação entre as peças de bambu e a fundação: dependendo do tipo de esforço atuante, consegue-se projetar peças metálicas específicas ou simplesmente ancorar, com um gancho metálico, o bambu ao bloco de fundação. O interior pode ser preenchido com cimento, o que aumenta a resistência e a durabilidade da parte inferior da peça.

CUSTO-BENEFÍCIO

Dependendo do tipo de construção, o custo de uma estrutura de bambu pode cair em 50%, comparado a uma estrutura convencional. “Contudo, isso é proporcional à qualidade da estrutura desenvolvida. Infelizmente o Brasil carece de fornecedores de bambu com qualidade e quantidade capazes de garantir um padrão nas construções de médio e grande porte. Por este motivo, para o desenvolvimento de sistemas estruturais elaborados ou com melhor padrão de acabamento, o responsável técnico pela obra deve agregar valor ao material utilizado. Tudo começa pelo processo de compra que, em grande parte dos casos, exige um tempo maior do que os contratantes normalmente têm a oferecer. O tratamento e a secagem do bambu são etapas que previnem problemas de infestações, rachaduras ou mudanças estruturais após a entrega da obra”, alerta.

A falta de mão de obra qualificada, no Brasil, ocasiona obras com um potencial de acabamento muito menor do que se poderia alcançar. Acabamentos bem feitos oferecem padrões estéticos e detalhes que tornam uma estrutura de bambu uma obra de arte em poucos dias. “A tendência é que ele se torne cada vez mais produzido e beneficiado, diminuindo o custo e aumentando a qualidade. Com isso, será possível desenvolver estruturas por um preço menor, mas com muito mais acabamento e durabilidade”, comenta o engenheiro, lembrando que, ao contrário dos materiais convencionais, o bambu não consome energia para sua produção. “Ele pode ser plantado em praticamente todo lugar, e utiliza mão de obra humana em todos os processos de beneficiamento, gerando renda local”.

PRODUTOS DE BAMBU

Existem muitos materiais de construção produzidos atualmente com bambu, como os painéis pré-fabricados estruturais, ideais para facilitar a montagem de casas inteiras em poucas horas. Com processos de industrialização também é possível fazer laminados, compensados, MDF e diferentes madeiras, usadas por várias empresas na fabricação de pisos, revestimentos, painéis e móveis.

“O bambu possui muitas vantagens técnicas como: leveza, beleza natural, acabamento único, durabilidade, facilidade de aproveitamento e resistência. Grande parte dos materiais de qualidade produzidos com bambu, no Brasil, é comercializada para os públicos A e B, e os produtos importados chegam ao país com um preço muito maior do que são vendidos em outros países”, finaliza.

Colaborou para esta matéria

Vitor Hugo Silva Marçal – Graduado em Engenharia Civil pela Universidade de Brasília (UnB). É diplomado no curso de Gestion Integral de Guadua angustifólia (GIGa), da Universidad Tecnológica de Pereira / Colômbia – Faculdade de Ciencias Ambientales e no curso Bamboo Technologies Training Course for Developing Countries, pela China National Bamboo Research Center and Ministry of Commerce of China – Hangzhou / China. Moderador do grupo Bambu-Brasil e secretário executivo da Associação Brasileira de Produtores de Bambu (ABPB). Responsável por um site (site www.projetobambu.com) sobre o uso do bambu na construção civil, que tem o objetivo de demonstrar a potencialidade deste material.