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Por que a iluminação natural é importante?

Publicado em: 23/08/2010

A crise de energia de 2001 já tem quase uma década e todos nós temos muito a aprender, a questionar, a aplicar. Muita gente surpresa: matriz energética limpa, rios abundantes, bastante energia e muito Sol. Não se investiu na geração e na distribuição adequadamente; por outro lado, arquitetos e engenheiros contribuíram na falta de sustentabilidade. Apesar de aprendermos diversas técnicas com uso de energias “alternativas”, preferimos, muitas vezes, os grandes espetáculos de luzes, excessivas até, sem nos importarmos com o consumo. Há, entretanto, ferramentas computacionais capazes de auxiliar projetos novos e reformas de maneira a utilizar melhor a benéfica e gratuita luz natural, com simulação precisa dos níveis de iluminação e imagens com surpreendente fotorealismo.

Deixamos de lado, por muito tempo, a melhor energia, aquela que não precisa ser gerada, pois já existe: a energia do Sol!

Se esse conhecimento é tão antigo, por que o uso da luz natural foi deixado de lado ou deixou de ser usado ou ensinado ou não tem sido considerada em toda sua potencialidade?

A natureza foi desafiada, o homem buscou fontes alternativas na iluminação – desde o fogo, lâmpadas a arco, incandescente, fluorescentes e vapores metálicos, fibra ótica, microondas, LED, etc.

O desafio aparece também quando planos diretores não consideram a insolação mínima na edificação que poderia melhorar a salubridade pela ação bactericida da radiação UV, quando a ventilação natural não é admitida ou o desrespeito aos regimes de ventos e mudanças climáticas, orientação solar inadequada das aberturas que, em conjunto, pioram, muitas vezes, a qualidade visual e ambiental.

O que podemos fazer?

A primeira etapa é a conscientização de consumidores, projetistas, administradores, governos, empresários – e isso está mais fácil atualmente: a crise atingiu o bolso de todos e, assim, todos se sensibilizam.

A segunda etapa é a concepção do projeto, que deve trazer sustentabilidade desde os primeiros esboços.

Embora a luz seja muito importante, o calor deve ser evitado nas áreas de clima quente.

Nesses locais deve-se bloquear a luz direta na fachada e no vidro. Isso resgata aquela parcela da luz refletida pelo entorno construído, da abóbada celeste: a luz difusa, indireta, quase sem aquecimento.

Existem ferramentas gráficas como diagrama solares utilizados para projetar anteparos, proteções e elementos de redirecionamento da luz natural, mas não fornecem os cálculos de quantitativo da iluminação resultante.

Com a atual capacidade dos microcomputadores, pode-se recorrer a procedimentos analíticos, computacionais, que podem fornecer dados e valores bem estimados, considerando as muitas reflexões da luz nas superfícies, inclusive com excelente qualidade visual para mostrar o resultado.

Que benefícios justificam a utilização da iluminação natural?

A luz é estudada de dois aspectos complementares, e ambos interferem na qualidade visual: como arte, com efeitos plásticos de cor, texturas, sombras e, como ciência, como uma necessidade fisiológica para tarefas visuais ou para sensibilizar o olho humano. Em todos esses aspectos, a luz natural é melhor.

Podemos reunir diversos aspectos importantes e, atualmente, benefícios muito válidos sob aspectos tanto ecológicos como financeiros e sociais:

- No planejamento urbano de diversos municípios já há dispositivos sobre o mínimo de insolação nas edificações; tais aspectos são muito importantes para a qualidade do ambiente, principalmente relacionados com higiene e salubridade. As certificações levam isso em conta, são muito importantes e qualificam o projeto e a obra;

- As empresas, tanto para obtenção como para a continuidade da certificação ISO 14000, devem, periodicamente, mostrar novas medidas de eficiência energética e redução de consumo;

- A luz como ferramenta no projeto, desenvolve uma nova consciência de estudantes e dos profissionais bem como incrementa uma nova plástica, nova volumetria, novos partidos;

- Há melhoria na avaliação e diferenciação do imóvel, mostrando aos clientes, investidores e usuários que o custeio e manutenção serão menores, como diferencial do convencional.

E sobre o aquecimento?

O aquecimento trazido pela luz solar ocorre quando há incidência direta em superfícies transparentes como o vidro, mas, ao incidir num material opaco e claro, boa parte do calor é absorvido e grande parte da luz é refletida de forma difusa. Essa iluminação indireta redirecionada, praticamente, não aquece o ambiente e melhora aspectos psicológicos, modela volumes e texturas e reproduz bem as cores.

A luz natural compreende tanto a insolação direta como a contribuição da abóbada celeste e do entorno construído, o que significa que há elementos de redirecionamento da luz, como muros, fachadas, edifícios e que atuam como fontes secundárias, capazes de contribuir com parcela significativa de iluminação natural.

Um elemento muito interessante é a prateleira de luz ou “lightshelf”, superfície normalmente horizontal, fixa ou dinâmica, inclinada e ajustável, instalada acima da linha de visão, como uma marquise. Pode ser executada em diversos materiais conforme durabilidade, presença de ventos e vibrações, composição com o projeto, podendo ser em concreto armado, estrutura metálica e fechamento em fibra de vidro, chapa metálica, fibrocimento, lona tensionada, etc., preferencialmente em cores claras.

A prateleira de luz bloqueia a insolação na janela, traz iluminação redirecionada e com homogeneidade luminosa ao ambiente, permite contato visual com o exterior e evita desbotamento de revestimentos e ressecamento de materiais.

A área próxima das janelas tem a iluminação artificial normalmente desligada; a área mais distante da abertura, se precisar de iluminação artificial complementar, será com menor potência.

Tal efeito pode ser simulado e calculado pelo computador com aplicativos adequados, verificando os níveis de iluminação somente com a luz natural e o resultado com a luz artificial.

Também é possível estudar tamanhos e formas variadas, bem como inclinações, cores e horários.

O vidro, elemento construtivo maravilhoso, se usado em excesso e sem sombreamento, pode trazer calor indesejável, transformando ambientes em estufas, aumentando gasto energético com climatização, pois estamos num país predominantemente tropical. Há, contudo, regiões onde o aquecimento é benéfico e isso também deve ser levado em consideração, pois somos um país continental, com climas diferentes.

E sobre os custos de elementos de redirecionamento?

Pela estimativa, mesmo com a limpeza e manutenção, as lightshelves se autocusteiam pelos seus benefícios. Há aproveitamento da luz natural e mais qualidade em manter o acesso visual ao ambiente externo. Ocorre redução do contraste entre áreas muito iluminadas próximas das janelas e as áreas menos iluminadas, homogeneizando os níveis de forma agradável e permitindo pequenas variações com as mudanças da luminosidade do céu com o passar do dia.

Isso somente é aplicável em obras novas ou é possível adotar em obras em uso, reformas?

Ao ser adotado na elaboração do projeto, a princípio os ganhos tendem a ser maiores que em reformas, além de haver uma harmonização dos elementos construtivos na concepção do volume da edificação, mas em obras prontas, como um “retrofit”, é possível mas devem ser feitos estudos de viabilidade e prazo de amortização. Nesse sentido, é muito importante a simulação computacional tanto para analisar os resultados plásticos como econômicos.

Quanto é, afinal, a redução do consumo?

Nos estudos e obras, a redução com a iluminação artificial que deixa de ser ligada é da ordem de R$ 15 a 20,00/m²/ano, mas isso varia bastante pois depende do uso, freqüência, etc.

Afinal, é de se esperar que escritórios de arquitetura e engenharia, incorporadores, órgãos públicos e empresas privadas interessadas em qualidade ambiental e eficiência energética atuem com sustentabilidade. Deve-se usar a tecnologia – tanto gráfica como computacional – para estudar e mudar o partido, usando a luz como ferramenta de projeto. A iluminação e computação gráfica devem ser instrumentos a serviço da qualidade do ambiente construído, do conforto nas condições de trabalho e bem estar da sociedade, com economia de recursos energéticos, por um desenvolvimento sustentável e por uma arquitetura ecologicamente correta e mais adequada ao Brasil.